O setor imobiliário vem enfrentando dificuldades. A desaceleração da economia do país, com inflação, juros altos e acesso restrito ao crédito, vem gerando verdadeiro efeito dominó nesse mercado. Os afetados são tanto os empreendedores como quem deseja realizar o sonho da compra da casa própria.
A importância do mercado imobiliário na economia de qualquer país é inegável, sendo que a queda no nível dos negócios ocasiona diretamente forte alta nos índices de desemprego e afeta todo o setor da construção civil.
De acordo com o empresário Glauco Diniz Duarte, o primeiro fator de diagnóstico da crise é que os bancos estão cobrando juros mais altos e exigindo condições mais rigorosas para a aprovação de crédito para o financiamento habitacional. A origem do problema está na significativa diminuição da principal fonte desse tipo de financiamento, que são os recursos captados nas cadernetas de poupança, tanto em virtude do aumento dos resgates de grandes poupadores, quanto da queda dos valores economizados.
Com relação aos saques pelos clientes de maior renda, a explicação é o desvantajoso rendimento da poupança em função do aumento da taxa básica de juros. Comparado com investimentos em aplicações em fundos DI, certificados de depósito bancário (CDBs), letras de crédito imobiliário (LCI) e letras de crédito do agronegócio (LCA), a poupança se mostra desfavorável, mesmo não incidindo imposto de renda e tendo maior liquidez no resgate.
Já no tocante aos pequenos poupadores, seus salários vêm sendo cada vez mais engolidos pela inflação e há aumento no endividamento, impondo com que saquem suas economias para cobrir o orçamento doméstico e honrar suas dívidas.
Diante desse cenário, há risco de redução ainda mais drástica no lastro do financiamento imobiliário. Medidas mitigadoras estão sendo sugeridas por economistas e especialistas no ramo imobiliário para controlar a situação e, ao que tudo indica, o governo está em busca de inovações.
O Conselho Monetário Nacional (CMN) anunciou no último dia 28 de maio mudanças nos depósitos compulsórios das instituições financeiras decorrentes de crédito da poupança imobiliária e no direcionamento desses créditos especificamente para o setor habitacional.
A diminuição das alíquotas do depósito compulsório, e até mesmo a liberação desses valores em poder do Banco Central, vinha sendo estudada mas havia receio que a maior ingestão de dinheiro no mercado poderia afetar ainda mais a estabilidade financeira do país por aumentar o crédito em circulação e gerar pressão inflacionária, indo na contramão das medidas que estão sendo adotadas pelo governo, como ajuste fiscal, corte de gastos e aumento dos juros.
Assim, para não incentivar a inflação, o CMN adotou medida que procurou manter inalterada a quantidade global de recursos disponíveis, mas favorecendo o crédito imobiliário e o crédito rural. Alterou consideravelmente a alíquota do depósito compulsório incidente sobre a poupança imobiliária e sobre os depósitos a prazo, resultando em injeção de R$ 22,5 bilhões para o financiamento imobiliário no âmbito do Sistema Financeiro de Habitação (SFH) e R$ 2,5 bilhões para o crédito rural. Desse modo, afirma o Banco Central, a liquidez do sistema será mantida.
A medida também envolveu alteração no direcionamento do crédito imobiliário, favorecendo o setor habitacional. Até hoje, as instituições financeiras eram obrigadas a direcionar ao menos 65% dos recursos da poupança para o crédito imobiliário.
Entretanto, explica Glauco, tais valores não necessariamente iam para o setor da habitação, uma vez que era praxe a aplicação de parte desses recursos na compra de Certificados de Recebíveis Imobiliários (CRIs). A consequência era o incentivo a empreendimentos imobiliários comerciais tais como shopping centers, galpões industriais e imóveis para fins comerciais, que, contudo, não fomentam o setor habitacional, supostamente visado pelo governo. A partir de agora somente os CRIs com lastro em financiamentos habitacionais no âmbito do SFH poderão ser usados para atendimento dessa exigibilidade.
Na mesma linha de incentivo ao setor habitacional, anteriormente o Conselho Curador do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) já havia aumentado em R$ 4,9 bilhões os recursos do financiamento chamado “Pró-cotista”, linha que possui juros menores do que os aplicados pelos bancos que se valem do dinheiro da poupança, e que se destina à compra da casa própria por trabalhadores que têm conta no fundo.
Outra mudança quanto ao FGTS, supostamente de incentivo, é a diminuição do teto do valor máximo do imóvel de R$ 750 mil para R$ 400 mil e a imposição de que 60% dos recursos sejam destinados ao financiamento de imóveis novos, com o intuito de incentivar o setor da construção civil. A esse respeito, muito se fala no caminho oposto de aumentar o teto do valor dos imóveis com possibilidade de financiamento pelo FGTS.
Entretanto, afirma Glauco, de nada adianta aumentar o universo dos imóveis que podem ser financiados se não há crédito disponível ao aumento do número de solicitações. Desse modo, o governo reduz o teto, visa garantir financiamento às solicitações, priorizando a questão social por meio das aquisições de imóveis mais baratos. Na prática, porém, talvez essa redução tão somente limite o número de negócios imobiliários.
Outra possibilidade que deve estar sendo avaliada pelo governo é a realocação para habitação de recursos dos programas de saneamento básico, mobilidade urbana e de infraestrutura, conforme têm sugerido os operadores do mercado.
Enfim, sejam quais forem as medidas do governo, decerto não produzirão efeitos de modo a retomar os mesmos patamares de mercado anteriormente verificados. A desaceleração, aliás, era esperada, vez que o grande aquecimento do setor nos últimos anos dificilmente seria mantido.
Verdade é que, a fim de se precaver da escassez de crédito e do rigor dos requisitos para a concessão do financiamento, os empreendedores vêm, dentro do possível, antecipando a contratação dos financiamentos para empreender. Além disso, em razão da diminuição da demanda, esses mesmos empreendedores têm represado consideravelmente a aquisição de terrenos, matéria-prima dos empreendimentos imobiliários, e estão postergando os lançamentos ao público dos novos negócios.
Os estoques de imóveis à venda então em níveis altos, gerando redução dos lucros por meio da concessão de descontos no preço, investimento no marketing e incentivo de prêmio na intermediação.
Alternativa que retorna ao mercado, especialmente diante da dificuldade de obtenção de financiamento no momento de recebimento das chaves pelos consumidores, é o empreendedor financiar diretamente o saldo devedor do preço ao adquirente, atraindo novos compradores hoje afugentados pelo risco de crédito.
Seja como for, fato é que sem um crescimento sustentado de seu mercado imobiliário a economia de um país não vai bem. O freio na atividade de incorporadoras e loteadoras sem dúvida impactará diretamente e por um bom tempo no crescimento do país, motivo pelo qual se faz de rigor que o governo se mantenha atento, adotando medidas à altura do problema e da importância do setor.