Quando ouvimos falar em gurus de tendências, pode parecer que existem pessoas e instituições que se reúnem de tempos em tempos para determinar como o resto da humanidade vai morar (ou se vestir, se alimentar, se relacionar e se divertir) dali em diante. Mas não é assim que a coisa funciona. As tendências surgem na sociedade, no comportamento cotidiano das pessoas, e refletem o que está acontecendo no mundo. “O pesquisador de tendências nada mais é do que um bom observador do presente, que sabe ler e interpretar sinais de mudança e, com base neles, inferir o que vai acontecer no futuro”, afirma Sabina Deweik, do Future Concept Lab, um centro de pesquisas com sede em Milão, Itália. Cada instituto tem seu método de trabalho, mas, em linhas gerais, analisam os movimentos sociais, as inovações tecnológicas, as condições climáticas, a política, a economia e as artes para detectar as chamadas macrotendências (as mais duradouras), sem deixar de lado os fenômenos mais locais, isolados ou rápidos, que constituem as microtendências.
Como isso tudo chega à nossa casa? De várias maneiras. Se você compra um sofá de linhas retas e elegantes, claramente influenciado pelo design italiano, dificilmente vai estabelecer uma relação entre o móvel e a Segunda Guerra Mundial. Pois ela existe. Em seu livro História da Arte como História da Cidade (editora Martins Fontes), o historiador italiano Giulio Argan explica como seu país se tornou a meca do design: após a derrota no conflito, houve um grande esforço da indústria italiana para romper com a estagnação e se equiparar às nações industrialmente mais avançadas. Isso aconteceu por meio de peças ícone, que evocavam a tradição artística do país. “Falou-se no italian look e, de fato, quase toda a produção italiana buscou efeitos visuais imediatos e agradáveis”, escreve Argan.
Se você quiser um exemplo mais recente, pense no 11 de Setembro, o maior acontecimento da última década. “Os ataques terroristas reforçaram nas pessoas o sentimento de coletividade. Nas casas, isso pode ser notado na valorização dos ambientes de encontro, como a cozinha e o jardim”, conta Sabina Deweik. A crise financeira dos últimos três anos também já produziu consequências perceptíveis na decoração.
“No Brasil, ela trouxe o retorno das cores como uma forma de nos alegrar. Sempre que superamos um momento difícil, as casas se tornam mais coloridas”, diz a consultora de tendências Ruth Fingerhut, da Fingerhut Design. Além de fatos de grande impacto, que mudam mentalidades e comportamentos, as tendências também nascem de pessoas com alta capacidade de se expressar e se diferenciar, que recebem o nome de trendsetters (lançadores de tendência) ou vanguardistas. Sabe quando você vai à casa daquele seu amigo estiloso e fica com vontade de ter uma igual?
“Essas pessoas têm uma compreensão intuitiva do mundo e conseguem causar surpresa de modo natural. A enorme curiosidade e a vontade de aprender são suas qualidades principais”, afirma Blanca Liane, agente no Brasil do birô de estilo francês Carlin. Os vanguardistas podem estar em qualquer lugar. “Por isso, hoje o maior laboratório do pesquisador de tendências é a rua. Se a ideia é captar as mudanças do morar, vamos à casa das pessoas”, diz Sabina Deweik. Foi o que fizemos nesta reportagem: ir à casa de pessoas antenadas e mostrar ambientes inspiradores.Como surgem as tendências