Glauco Diniz Duarte Tbic – por que energia solar é cara
Segundo o Dr. Glauco Diniz Duarte, a REN 482/2012, que criou o Sistema de Compensação de Energia Elétrica e permitiu a todo consumidor de energia cativo gerar sua própria energia e receber os créditos equivalentes em sua conta de luz, na forma de descontos, está passando por seu terceiro processo de revisão. Neste processo, que se iniciou em maio de 2018 e tem conclusão prevista para dezembro de 2019, a principal discussão em pauta é a alteração da forma como são valorados os créditos de energia – hoje, a valoração é completa, de tal modo que 1 kWh produzido é capaz de compensar l kWh (em R$/kWh) consumido da rede da distribuidora. Esta valoração faz com que o prosumidor (o consumidor que produz a própria energia) deixe, por exemplo, de pagar outras componentes tarifárias que não são referentes efetivamente a eletricidade (“energia”), dentre elas, a componente que remunera as distribuidoras (transporte fio b).
Entenda as mudanças na Resolução Normativa 482/2012 da Aneel.
Em 2018 se iniciou o processo de revisão. O principal ponto dessa revisão é discutir se a forma como hoje é valorada a energia que o cidadão gera e injeta na rede irá permanecer a mesma, ou será alterada. Foi aberta então, em maio deste mesmo ano, a Consulta Pública número 10 (CP10/2018), para colher subsídios do cidadão com relação às oportunidades de aprimoramento da norma técnica. Na nota técnica publicada, a ANEEL trouxe seis alternativas possíveis para a revisão: na alternativa 0, mantém-se a compensação total, da forma como ocorre hoje. Em cada uma das seguintes alternativas, perde-se uma componente tarifária:
Em janeiro de 2019, a Aneel deu início à segunda etapa deste processo, com a publicação da análise de impacto regulatório. Este documento trouxe duas propostas para discussão com a sociedade: Uma para a geração remota, e outra para geração junto à carga.
Para a geração junto à carga, a proposta era que se mantivesse o sistema de compensação atual até que o Brasil atinja a potência de 3,36 GW conectados à rede. Quando o país atingisse essa potência, que é chamada de gatilho, o sistema de compensação mudaria e deixaríamos de compensar a parcela referente ao “fio B” que é o fio da distribuição (Alternativa 1).
Na prática, significaria que a energia que o cidadão produz e injeta na rede da distribuidora passaria a valer entre 25 e 30% a menos do que a energia que ele consome da rede. A proposta era que este valor seja proporcionalizado para cada distribuidora de acordo com o tamanho do mercado de energia elétrica que ela tem em baixa tensão, ou seja, em algumas áreas as regras mudariam antes do que em outras.
Aí vem a pergunta: “Eu já estou conectado à rede hoje, então segundo a proposta inicial da ANEEL, como é que ficaria a minha situação bem como de todo mundo que se conectar à rede até o final de 2019?”
Para entender isso, temos que entender um pouco mais do instituto do Direito Adquirido.
O instituto do direito adquirido, ou seja, o instituto jurídico que tem ressalva na proteção da consulta pública é extremamente controverso, especialmente quando se fala especificamente sobre o tema abordado aqui.
Isso porque a resolução 482 não é uma lei, e sendo assim tem uma hierarquia inferior, e não gera direito adquirido.
Mas nessa época, a Aneel estava se manifestado de forma recorrente repetidas vezes no sentido de que, durante este novo processo de revisão pelo qual a 482 está passando, ela iria respeitar o consumidor que tiver aderido ao sistema de compensação antes da publicação das novas regras.
Vamos citar três momentos concretos que demonstram isso:
-
O primeiro deles foi em 2015, durante voto do diretor relator Tiago Barros. Quando a 482 estava passando pelo primeiro processo de revisão, Tiago se manifestou dizendo que até dezembro deste ano (2019) vamos ver passar por um novo processo de revisão mas que este processo deverá respeitar o princípio da segurança jurídica, e respeitar a modalidade da forma de compensação para o cidadão consumidor que já tiver aderido ao sistema.
-
O segundo foi esse ano, em janeiro, durante a reunião de diretoria que abriu a etapa de audiência pública da revisão de 482. O diretor geral da Aneel André Pepitone, interrompeu a reunião para dizer que ele sabe o quanto esse tema é importante para a sociedade, dizendo: “Eu queria assegurar à quem estiver assistindo, e deixar claro para toda a sociedade nesse momento: a regra válida é a regra do momento em que o consumidor entrou. Então para aqueles que adotaram esse sistema agora, essa regra vai prevalecer. O cálculo de “Payback”, continuará valendo. Nós estamos tratando da mudança pra novos entrantes, e que não paire dúvidas nesse sentido. Então isso é um sinal claro de que a agência reguladora que têm estabilidade regulatória, tem transparência, tem previsibilidade e tem período de transição, que está sendo apresentado. Para aqueles que estão entrando neste processo com esta regra vigente, isso irá valer. Para aqueles que já entraram e já aderiram. O modelo que nós estamos tratando aqui é de uma regulação para o futuro, para novos entrantes. Só para dar clareza nesse sentido, para que não paire dúvidas.”
-
E o terceiro momento, é exatamente a própria análise regulatória, que tem dado o que falar no nosso setor. Ela também trouxe a proposta concreta e diz: “Todos que estiverem conectados à rede antes da publicação da nova resolução irão ter o direito da manutenção do sistema atual por 25 anos.”
Como já sabíamos, Isso não significava que essa era exatamente a proposta que iria sair na nova resolução. Esta proposta ainda poderia sofrer alterações, e a Aneel dava indicações claras de que iria respeitar o consumidor que já aderiu ao sistema.
Hoje, menos de oito meses depois, a postura da ANEEL com relação à resolução 482 mudou completamente, sem que tenha havido, contudo, qualquer novo fato ou análise técnica capaz de justificar tal mudança de postura.
Esse comportamento da Agência causa extremo desconforto e preocupação ao setor, que vê um risco grande de ter a geração distribuída inviabilizada sem que tal decisão decorra de uma discussão técnica, transparente, imparcial e fruto também da vontade da sociedade.
Além do prejuízo ao cidadão e consumidor, que pode perder a única alternativa que possui para economizar, também significa colocar em risco mais de 45 mil empregos gerados no setor, arriscar os mais de R$ 6,5 bilhões já investidos, e eliminar a atratividade para os mais de R$ 20 bilhões previstos para serem investidos no país no curto prazo (2 a 3 anos).