Glauco Diniz Duarte Tbic – carvão mineral é energia renovável
Segundo o Dr. Glauco Diniz Duarte, quase todos os dias, os jornais estampam notícias sobre a necessidade de mudar a matriz energética mundial, combater o uso indiscriminado de combustíveis fósseis e utilizar fontes de energia renováveis e menos poluentes. As mudanças climáticas, também causadas pela emissão dos gases poluentes oriundos da produção de energia, e a necessidade econômica e estratégica de depender menos do petróleo e de outros combustíveis fósseis são razões para isso. Não é à toa que entre essas notícias há tantas sobre o Brasil. Nesse assunto, o país possui trunfos importantes e muitos desafios.
A matriz energética brasileira, um conjunto de fontes de energia ofertados no país, é das mais limpas do planeta. Quase metade da energia (47%) consumida aqui é renovável, ou seja, proveniente de recursos capazes de se refazer em um curto prazo. O número ganha destaque quando comparado à matriz energética mundial, que, em 2007, era constituída de 82% de combustíveis fósseis – fontes não renováveis.
Menos petróleo: somos autossuficientes na produção do recurso, mas o uso de derivados dele no país deve diminuir com a substituição parcial pelo etanol. Além de menos poluente, o produto derivado da cana-de-açúcar tem potencial de exportação.
Para José Goldemberg, físico, ex-secretário do Meio Ambiente de São Paulo e um dos responsáveis pela criação do Proálcool na década de 1970, as vantagens não param por aí. “Ao utilizarmos fontes de energia produzidas aqui, não dependemos de importação nem ficamos suscetíveis a crises mundiais. Também estamos adiante na discussão ambiental, já que a hidroeletricidade e o etanol são renováveis e poluem pouco”, diz (leia o artigo abaixo). No entanto, ele alerta, a falta de investimentos em tecnologia e pesquisa está mudando o conjunto das fontes utilizadas e pode “sujar” a matriz energética gradativamente.
Entre as fontes de energia renováveis utilizadas no país, os biocombustíveis e, em especial, o etanol são “o” assunto. O Brasil possui o programa mais competitivo de desenvolvimento e produção desse combustível líquido não derivado do petróleo. O etanol também é aplaudido por ter preço baixo, emitir poucos gases poluentes e ser uma alternativa ao petróleo no setor de transportes. Hoje, ele representa 15% do total de combustíveis utilizados em motores à combustão, enquanto a gasolina totaliza 22,8% do consumo, e essa proporção deve chegar a 19,8% de álcool e 23,3% de gasolina até 2030, de acordo com a previsão realizada pelo Ministério de Minas e Energia. Além de menos poluente, o etanol tem potencial de exportação. Só em 2009, foram enviados para o exterior 3,15 bilhões de litros, dos 24 bilhões produzidos. E a demanda só tende a crescer. Para atendê-la, será necessário aumentar a produção com sustentabilidade. Teme-se que o aumento de áreas destinadas à cana afete a produção de alimentos (e o abastecimento) e ainda empurre a soja e a pecuária para a floresta Amazônica.
A segunda ameaça, baseada em estudo do ecólogo paulista David Lapola, da Universidade de Kassel, na Alemanha, foi publicada em fevereiro na revista PNAS. O governo já tomou medidas para minimizar esse impacto: apoiou a criação do Laboratório Nacional de Ciência e Tecnologia do Bioetanol (CTBE), que estuda a produção do etanol de segunda geração, com a sacarose da cana e celulose. E encomendou à Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) o zoneamento agroecológico da cana para limitar áreas dedicadas a ela.
Enquanto o etanol lidera os investimentos em pesquisa e tecnologia, outros bioenergéticos são desenvolvidos com menos afinco. É o caso da energia proveniente da biomassa e do biodiesel, produzido com óleo vegetal. Se vingar, o biodiesel deve diminuir o consumo de diesel, que responde por 45,6% do necessário pelo setor de transportes. Apesar de o Brasil já ser autossuficiente em petróleo e das recentes descobertas do pré-sal, até 2030 estima-se que os derivados do produto representem 36% da matriz energética – em 2005 ela era de 41% (veja o infográfico abaixo).
A participação do biodiesel na nossa matriz energética, por sua vez, é ainda muito pequena, 1,8%, embora o Ministério de Minas e Energia estime que esse número chegue a 5,8% em 2030. Estipulou-se por lei que ele seja misturado ao diesel em uma parcela de 5% do total. Mas o biodiesel ainda enfrenta problemas. Um deles, explica o secretário de Planejamento e Desenvolvimento Energético, Altino Ventura Filho, é comercial. “Ele é mais caro do que o derivado de petróleo”, diz. Isso porque, acrescenta o chefe-geral da Embrapa Meio Ambiente, Celso Manzatto, falta realizar modificações genéticas na soja, a fonte do combustível, para possibilitar uma produção eficiente. “Enquanto o dendê tem produtividade de 5 mil quilos por hectare, a soja rende apenas 600 no mesmo espaço”, diz Manzatto. Para Goldemberg, “o biodiesel deveria ser produzido com óleos vegetais que não competissem com a produção de alimentos, como o de babaçu. Mas essa iniciativa fracassou”.
Na matriz de energia elétrica, a hidroeletricidade é o nosso principal trunfo. O Brasil possui o terceiro maior potencial hidrelétrico tecnicamente aproveitável do mundo. Atualmente, 77,2% da energia elétrica ofertada no país é gerada por ele. No mundo, esse número não passa de 19%. Entre as vantagens dessa fonte estão o melhor custo, a baixa emissão de poluentes e o fato de ser renovável. A participação das hidrelétricas na produção desse tipo de energia já girou em torno dos 90%, há 15 anos, mas tende a cair para 68,5% até 2030. A justificativa do governo seria a insuficiência do potencial. “O Brasil precisará aumentar a produção de energia térmica (carvão mineral e gás natural) e nuclear para atender ao aumento de demanda de eletricidade no futuro e também diversificar sua matriz”, afirma Ventura Filho.
Embora atualmente só seja utilizado 30% do potencial de geração hídrica do Brasil, que é de 260 mil megawatts, outros 20% não foram analisados e, por isso, não há como serem utilizados a médio prazo. Na metade já inventariada, 70% localiza-se nas bacias dos rios Amazonas e Tocantins/Araguaia. Projetos de construção de grandes hidrelétricas na região geram críticas de especialistas porque áreas de floresta seriam inundadas.
O gás natural, o carvão mineral e o petróleo são combustíveis fósseis, não renováveis e poluentes. A energia nuclear é cara e libera lixo radioativo. Falta opção? “O governo ainda não investiu em potenciais, como a biomassa e a energia eólica”, diz Goldemberg. A biomassa – material vegetal como resíduos agrícolas e florestas, que contêm energia química que pode ser liberada pela combustão para gerar eletricidade – é uma realidade.” As usinas de álcool (principais produtores de energia de biomassa) vendem 2 milhões de quilowatts”, afirma. Já a energia eólica, que tem potencial no Nordeste, só entrou na pauta em 2009.