Globalmente, o investimento em energia solar bateu recorde no ano passado: 18% a mais do que no ano anterior e recebeu mais investimentos do que outro tipo de fonte energética, segundo a Organização das Nações Unidas (ONU). Foram mais de US$ 160,8 bilhões de recursos, segundo o relatório da organização, publicado em abril deste ano.
O Brasil é um dos países que têm uma incidência solar de 5,4 quilowatt-hora/metro quadrado – mais do que Estados Unidos, China e Alemanha, por exemplo. No entanto, em termos de capacidade instalada de geração fotovoltaica, o Brasil tem apenas um gigawatts. A China, por exemplo, tem 130 gigawatts. No entanto, o cenário parece estar se revertendo. Em 2016, o número de microgeradores de energia solar cresceu 407% em relação ao ano anterior, segundo dados da Aneel. A expansão acentuada aconteceu principalmente em residências (80%). Para 2024, o órgão estipula que serão 886,7 mil unidades consumidoras que receberão créditos dessa energia, totalizando uma potência instalada de aproximadamente 3,2 GW.
O crescimento é justificado principalmente pelo barateamento dos painéis. Não por acaso, diversas companhias do setor estão investindo na área. Um desses exemplos é a distribuidora Celesc. Com o Projeto Bônus Fotovoltaico, a empresa contemplou 1250 residências no estado de Santa Catarina com um subsídio parcial para a instalação de sistemas fotovoltaicos. A ideia do projeto, como explica Marco Aurélio Gianesini, gerente do Departamento de Engenharia e Planejamento do Sistema Elétrico, era reduzir o consumo de energia elétrica dos consumidores, ampliar a utilização de energia renovável e criar expertise em um novo mercado que está se fortalecendo.
“Para a distribuidora, precisávamos aprender um pouco da tecnologia, do ponto de vista operacional, dialoga com nossos valores de sustentabilidade e também dá oportunidade de criação de novos negócios. Esse mercado vai crescer muito nos próximos 10 e 15 anos, e temos interesse em conhecer a fundo”, relata.
Com o subsídio, os preços do sistema, que geralmente giram em torno de R$ 20 mil, caíram para R$ 6,68 mil para cada consumidor. No total, o investimento chegou a R$ 17 milhões – R$ 11,3 milhões provenientes do Programa de Eficiência Energética da ANEEL/Celesc. As instalações começaram em abril de 2017 e foram finalizadas oito meses depois, sendo constantemente monitoradas pela Celesc e pela empresa contratada para o projeto, a Engie.
“Quando fazemos um cálculo rápido de viabilidade para o consumidor que pagou esse sistema, olhando a quantia de energia que vai gerar de crédito [na conta de luz], o que significa a redução da fatura, o investimento é compensado em três anos. E o equipamento tem vida útil de 25 anos: ou seja, por 22 anos, eles apenas usufrui dos benefícios”, exemplifica.
Algo que surpreendeu o gerente foi o engajamento e interesse das pessoas em instalar os painéis. Inicialmente, o plano era subsidiar mil sistemas – no entanto, a empresa teve que fechar as inscrições em cinco dias, porque mais de 12 mil pessoas já tinham pedido o auxílio. Em Florianópolis, por exemplo, os 200 equipamentos disponíveis se esgotaram em apenas sete minutos – o que demonstra, para Gianesini, o sucesso do projeto e da campanha. “O legal é que várias distribuidoras gostaram do modelo que aplicamos e estão replicando isso”, comemora.
Sol gerando energia em moradias populares
Dentro do Comitê de Inovação e Sustentabilidade da CDHU (Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano do Estado de São Paulo) também surgiu a discussão de usar o sol como fonte energética. Como o foco da empresa é a construção de moradias de interesse social, atendendo predominante famílias com renda entre um e três salários mínimos, a grande vantagem do projeto, é justamente o impacto na conta de energia dos mutuários, como relata o superintendente de Orçamento, Programação e Controle da organização, Silvio Vasconcellos.
“Isso tem impacto direto no que chamamos de ‘custo de morar’. Temos que ter uma casa que não dê custos altos de manutenção e que seja sustentável, com esquemas de gastar pouca água, com uso racional de energia. Os resultados de pilotos são extremamente satisfatórios. O que tem acontecido é que o consumo tem se mantido nos padrões anteriores, e isso significa redução nas contas”, explica.
A ideia é também implementar os sistemas nas Unidades Habitacionais entregues entre 2011 e 2016 (51 mil unidades) e também nos empreendimentos novos a serem construídos pela CDHU. Vasconcellos lembra que o projeto teve um impacto muito além da questão energética: mexeu também com os processos de produção e construção da empresa, fazendo com que ela busque processos mais sustentáveis, com menos uso de água, menos geração de entulho, por exemplo. “Durante a construção dos próximos empreendimentos, esses equipamentos [solares] serão instaladas nos canteiros de obra, produzindo energia para a construção. Ou seja, não mexe só no resultado final, que é a casa: mexe com o processo de produção. Estou fazendo uma construção mais sustentável também”, exemplifica.
Vasconcellos acredita que instalar um equipamento de tecnologia de ponta em camadas de baixa renda aumenta a capacidade de difundir a informação e também de acelerar a queda de preços. O diagnóstico do especialista é que, apesar da disponibilidade da tecnologia, ela estava concentrada nos nichos comerciais, industriais e também nas habitações de padrão elevado, concentrada nas classes mais privilegiadas. “É uma introdução de tecnologia de baixo pra cima e com certeza vai causar uma popularização no mercado”, relata.
O executivo acredita que a instalação de painéis em construções de classe média é uma “questão de tempo” por conta dos benefícios, ainda mais com a perspectiva de queda de preço. Além disso, com a popularização desses novos sistemas, novos empregos serão gerados, cada vez mais especializados em uma energia limpa e renovável. A iniciativa da Celesc e da CDHU receberam o Prêmio Eco de Sustentabilidade da Amcham no ano passado.