Glauco Diniz Duarte Tbic – como montar fotovoltaica
Frequentemente circulam pelas redes vídeos e imagens de telhados que caem na ocorrência de chuvas e ventos. Tudo seria “normal” se não existissem sistemas fotovoltaicos instalados nesses telhados. Fica a dúvida: os painéis solares favorecem a queda dos telhados? Deveríamos nos preocupar com a segurança dos telhados antes da instalação dos sistemas?
Sempre que cai um telhado com um sistema fotovoltaico, antes de colocar a culpa no vento cabe uma pergunta: foi feita a análise estrutural do prédio e da cobertura antes da instalação do sistema fotovoltaico? Somando placas e estruturas de fixação, tem-se tipicamente uma sobrecarga de até 15 kgf/m2 no telhado. Não é pouca coisa.
A análise estrutural é necessária em qualquer instalação fotovoltaica. Naturalmente, em pequenas instalações, com meia dúzia de placas em telhados residenciais, a análise estrutural é um preciosismo que acaba sendo dispensado pelo bom senso. Mesmo assim, o bom senso às vezes falha, pois já houve relatos de telhados residenciais que ruíram durante a instalação.
O vento e a chuva devem ser previstos nos projetos. Não podemos simplesmente instalar sistema fotovoltaicos sem qualquer preocupação com a segurança do telhado ou mesmo do prédio. O telhado caiu após uma chuva com vendaval? Não podemos colocar a culpa no vento. Instalar sistemas fotovoltaicos em telhados sem análise estrutural do telhado e do prédio é um crime de responsabilidade. A queda de um telhado pode ocasionar danos materiais e perdas de vidas humanas. Esse assunto é sério e deve ser tratado com todo o rigor que a engenharia possibilita.
O que é necessário para analisar uma estrutura de telhado ou cobertura?
O projetista fotovoltaico não precisa ser especialista em telhados. Para resolver essa questão existem duas especialidades da engenharia: civil e mecânica. A empresa responsável pelo projeto e pela instalação do sistema fotovoltaico deve buscar o auxílio de um engenheiro especializado em estruturas realizar a análise do telhado ou também do prédio. Fazer um bom projeto e dormir tranquilo não custa muito mais caro. O valor do projeto estrutural deve fazer parte da composição de custos do projeto fotovoltaico.
Primeiro passo – avaliação da estrutura
É recomendável que o engenheiro estrutural visite o local para fazer o levantamento das características da estrutura e do telhado. Em muitos casos, porém, devido à distância, a avaliação pode ser feita por outro profissional, por meio de croquis e fotos, como ocorre em alguns casos. Deve-se fazer o levantamento das dimensões e localizações dos pilares, das terças, das treliças e tesouras do telhado. É necessário levantar as características do material que foi empregado na fabricação das estruturas (tipo de perfil, espessura, tipo de aço) e o tipo de telha usado na cobertura. Uma dica: pode-se buscar o auxílio de um serralheiro (toda cidade tem um) para fazer essa avaliação. Fotos e filmes das estruturas também podem auxiliar o engenheiro estrutural na realização do projeto.
Segundo passo – projeto estrutural
Quer dizer que vamos fazer o projeto estrutural do prédio e da cobertura só para poder instalar o sistema fotovoltaico? Sim, vamos fazer. Mas não é “só” para instalar o sistema fotovoltaico. É para você poder dormir tranquilo. Obviamente o projeto deveria ter sido feito antes da construção do telhado, mas não foi feito (ou o projeto até existiu, mas se perdeu).
Um projeto estrutural de um galpão de médio porte (digamos, algo em torno de 2000 m2) é um trabalho de uma semana ou menos. É um serviço prestado por engenheiros civis ou mecânicos, que possuem a atribuição profissional para o cálculo de estruturas. O projeto estrutural não tem impacto significativo no cronograma ou no custo do sistema fotovoltaico. É um serviço que deve ser considerado desde o início da concepção do projeto fotovoltaico. Quantos telhados precisarão cair para o mercado se conscientizar disso?
Após levantadas todas as características da construção e do telhado realiza-se a modelagem das estruturas. Esse trabalho é realizado pelo engenheiro estrutural com o auxílio de programas de computador especializados como STRAP, ANSYS, CYPECAD e outros.
O que o engenheiro estrutural vai analisar? A análise estrutural é um trabalho de relativa complexidade, que leva em conta diversas normas técnicas, dentre as quais podemos destacar:
ABNT NBR 8800/2008 – Projeto de estruturas de aço e de estruturas mistas de aço e concreto de edifícios
ABNT NBR 14762/2010 – Dimensionamento de estruturas de aço constituídas por perfis formados a frio
ABNT NBR 6123/1988 – Forças devidas ao vento em edificações
ABNT NBR 6120/1980 – Cargas para o cálculo de estruturas de edificações
ABNT NBR 14323/1999 – Dimensionamento de estruturas de aço de edifícios em situação de incêndio – Procedimento
NBR 8681/1984 – Ações e segurança nas estruturas
Na análise estrutural são realizadas verificações quanto às ações das cargas gravitacionais, da sobrecarga acidental e do vento.
Cargas gravitacionais
Peso próprio (deve ser calculado, pois depende dos materiais empregados e das geometrias das estruturas)
Peso das telhas (de 7kgf/m2 a 12 kgf/m2, para telhas metálicas simples, por exemplo)
Placas fotovoltaicas, incluindo o sistema de fixação (15 kgf/m2)
Utilidades (10 kgf/m2 tipicamente) – acessórios que não fazem parte da estrutura mas podem estar apoiados ou dependurados nela, como instalações elétricas e hidráulicas, forros, etc.
Sobrecarga acidental
De acordo com a norma NBR 8800/2008, considera-se uma sobrecarga acidental mínima de 25 kgf/m2, correspondente a ações ou esforços que não foram previstos inicialmente. Essa consideração é obrigatória por norma.
Ações do vento
Finalmente, deve-se acrescentar à análise a ação dos ventos. A velocidade básica do vento no local da construção deve ser considerada, além dos fatores de topografia, rugosidade e estatístico (que altera o tipo de análise feita pelo software estrutural). Todos esses conhecimentos fazem parte do currículo dos engenheiros civil e mecânico.
Com essas considerações, após feitas todas as análises, não podemos culpar o vento pelo desabamento de um telhado. Aplicam-se dados conhecidos, fatores estatísticos, coeficientes de segurança, sobrecargas acidentais. Em um projeto de engenharia não deve existir chance para o azar.
Colocação do sistema fotovoltaico dentro da margem de segurança existente
Em alguns casos, a critério do engenheiro estrutural, visando à redução do custo com reforços estruturais, pode-se fazer uma análise mais agressiva, mas ainda assim segura, conforme o item B.5.1 da NBR 8800/2010. O valor das cargas das utilidades pode ser englobado na sobrecarga até o limite superior de 0,05 kgf/m², o que reduz o peso total considerado sobre a estrutura do telhado. Além disso, pode-se incluir a carga dos painéis solares (15 kgf/m2) dentro do limite de carga acidental (originalmente 25 kgf/m2), sobrando ainda uma margem de segurança de carga acidental de 5 kgf/m2.
Em resumo, o parágrafo acima diz que não é necessário ter uma estrutura superdimensionada para aceitar a instalação do sistema fotovoltaico. Isso quer dizer que, se a estrutura foi projetada do jeito certo, dentro das normas, ela deverá suportar o sistema fotovoltaico sem nenhuma alteração, pois o peso dos painéis solares será incluído na margem de segurança que já existia no projeto.
Isso seria perfeito num mundo ideal. Infelizmente grande parte das estruturas que encontramos é construída fora das normas ou sem qualquer tipo de projeto de engenharia – nesse caso os reforços são necessários não somente pela presença do sistema fotovoltaico, mas porque a estrutura já era deficitária de qualquer modo. A presença do sistema fotovoltaico só vai precipitar o desastre – é por isso que qualquer “ventinho” coloca tudo abaixo.
Reforço estrutural: fazer ou não fazer?
Em muitos casos é realmente necessário fazer o reforço das estruturas. O resultado do projeto estrutural vai apontar essa necessidade. O engenheiro estrutural vai sugerir uma solução e fornecer uma lista de materiais. Um serralheiro pode então ser contratado para executar os reforços de acordo com as instruções do engenheiro.
Após a análise estrutural do telhado e da aplicação dos reforços sugeridos pelo engenheiro responsável, o resultado é um projeto fotovoltaico realizado em respeito a todas as normas e práticas corretas de engenharia. A empresa instaladora e o cliente podem dormir tranquilos. O custo do reforço estrutural, qualquer que seja, deve ser repassado para o cliente. Felizmente o custo do projeto estrutural e dos reforços não chega a inviabilizar o sistema fotovoltaico, o que é uma boa notícia.
Conclusão
Não existe milagre. Quer instalar um sistema solar com segurança? Então vai ter que fazer projeto estrutural e (talvez) o reforço das estruturas. Faz parte do jogo. Um projeto fotovoltaico é um projeto de engenharia e o mercado precisa enxergar isso. Temos visto por aí todos os tipos de erros crassos nas instalações fotovoltaicas. A falta de segurança no uso dos telhados é só mais uma das aberrações encontradas. Responsabilidade, profissionalismo e segurança nas instalações fotovoltaicas devem fazer parte das regras. Não existe espaço para amadorismo no mercado fotovoltaico.